A montagem As Polacas – Flores do Lodo retrata
a chegada de mulheres semi-analfabetas e pobres ao Brasil do período entre
guerras
A
vida de jovens judias prostitutas do leste europeu que imigraram para as
Américas no início do século 20, é tema da peça As Polacas – Flores do Lodo, que
estará em cartaz nos dias 20 e 21 de julho, no auditório Salvador de Ferrante
(Guairinha), em Curitiba.
Com
texto e direção de João das Neves, a peça foi idealizada pela atriz Luciana
Mitkiewicz, que pesquisou a chegada destas mulheres ao Brasil por cinco anos.
A montagem
estreou no Rio de Janeiro em 2011 e no ano seguinte foi apresentada em São Paulo e no Floripa
Festival. As Polacas – Flores do Lodo recebeu o Prêmio Funarte de Teatro Myriam
Muniz 2012 / Circulação e foi selecionado para o Projeto Viagens Teatrais do Sesi,
em 2013.
Em cena, como as polacas, e
negras, mudaram o curso da história lutando contra o estigma e conquistando
valores além do meretrício no período entre guerras. Boa parte das jovens
judias foi aliciada pela rede Zwi Migdal, de tráfico de mulheres. “Da rotina
amarga sobrou coragem para mudarem o rumo da realidade: elas criam uma
associação de apoio mútuo e erguem o próprio cemitério, ajudando a promover a
cultura e religião judaica entre os brasileiros”, afirma Luciana Mitkiewicz.
A montagem mescla samba e polca,
dor e humor, em uma narrativa original que alinha prostitutas judias e negras
como protagonistas, tendo como elo fatos reais e doses de ficção.
Estrutura - A história se passa na Praça Onze, centro do Rio de
Janeiro, berço do samba e da boemia carioca. O texto narra a chegada das
polacas que desembarcam no Brasil fugindo da fome e da perseguição religiosa. Pobres,
longe da família, semi-analfabetas e sem saber falar o idioma foram
discriminadas pela própria comunidade judaica e, de início, também pelas
prostitutas locais que temiam a nova concorrência.
Ao longo de As Polacas – Flores
do Lodo, o público reconhece melodias e identifica personagens como Moreira da
Silva e Ismael Silva.
A Praça Onze abrigou centenas de
estabelecimentos judaicos, assim como clubes, grêmios políticos e sinagogas.
Por outro lado, a região também era reduto dos negros recém-libertos da
escravidão.
No fim da década de 1930, a maioria dos prédios,
casas comerciais, prostíbulos e bares desta área foram demolidos para dar lugar
à Avenida Presidente Vargas. A associação das polacas fechou as portas em 1966
por falta de arrecadação.
“Não é um musical, a palavra é o
ponto alto do espetáculo. Mas tirei partido sim do contexto, afinal a peça se
situa entre duas culturas muito musicais”, conta o diretor. Assim, surge no
palco primeiro a rivalidade entre as prostitutas estrangeiras e brasileiras. Em
seguida, a transformação do estranhamento em amizade e laços de solidariedade”,
disse João das Neves.
Formado por 11 atores, o elenco
une gerações do teatro brasileiro, com nomes como Beth Zalcman, Iléa Ferraz,
Wilson Rabelo, Eduardo Osorio (Boa Companhia, de Campinas), Carla Soares, Lígia
Tourinho, Felipe Habib, Guilherme Tomaselli, Rodrigo Cohen e Luciana
Mitkiewicz. Os cenários são de Hélio Eichbauer, direção musical de Alexandre
Elias e a preparação corporal de Angel Vianna e Marito Olsson-Forsberg. A
consultoria judaica é de Frida
Zalcman (assistente do rabino Nilton Bonder).
Episódio histórico - A peça acompanha
os passos de Esther e Celina, da juventude à idade madura. A árdua convivência
nos prostíbulos cariocas, a violência da polícia e dos cafetões, a aspereza das
cafetinas, o preconceito social, a rejeição dos filhos, tudo ganha um
enquadramento especial no palco. Algumas destas mulheres eram prostitutas em
sua terra natal, mas a maioria chegou aqui em busca de uma vida melhor,
enganadas por traficantes – muitos, inclusive, judeus. “Chegando aqui, elas
eram levadas para as casas de tolerância e passavam a viver como párias
sociais. As famílias judias também recém-chegadas ao Rio não queriam ver seus
nomes ligados ao destas jovens e as tratavam muito mal”, conta João.
Naquela época, as cocottes francesas se tornaram a elite
do meretrício. A França era vista como um símbolo da modernidade e “freqüentar”
essas mulheres significava status. Enquanto elas ocupavam pensões do Flamengo,
Glória e Catete e foram absorvidas pela burguesia em ascensão, as polacas
ficaram relegadas aos prostíbulos da Zona do Mangue, nas cercanias da Praça
Onze carioca. Com os próprios recursos, fundaram a Associação Beneficente
Funerária e Religiosa Israelita que, entre outras ações, construiu o Cemitério
Israelita de Inhaúma, o primeiro cemitério judaico do Rio de Janeiro, capital
da República na época. Como no judaísmo prostitutas e suicidas são considerados
impuros – suas lápides são separadas das demais por muros – elas resolveram
criar seu próprio cemitério. Ali, eram enterradas com todos os rituais da sua
religião. “Uma forma de manterem sua identidade, fé e dignidade”, diz João.
A atriz carioca, Luciana
Mitkiewicz, começou a pesquisar a história das polacas em 2007, sobre as quais
encontrou farta bibliografia, músicas e cinema. “Convidei o João, com quem havia
trabalhado, a criar esta dramaturgia original mostrando como a Pequena África
se aproximou dos primeiros momentos da cultura judaica no Rio”, conta Luciana.
A Praça Onze e seus arredores,
onde as polacas se estabeleceram, têm papel importante na encenação. Ali
conviviam ricos e pobres, ex-escravos e imigrantes europeus, famílias de “bem”
e prostitutas, boêmios, artistas, jornalistas e sambistas. Considerada no
início do século passado um dos locais mais cosmopolitas da cidade, a área era
um caldeirão onde se misturavam diferentes culturas, crenças e etnias. A região
chegou a abrigar a maior concentração de judeus da história do Rio de Janeiro.
Eles elegeram o local principalmente porque ali existiam casas perfeitas para o
comércio, com espaço para lojas no térreo e residências nos andares superiores.
Perfis:
João das Neves é um dos maiores nomes
do Teatro Brasileiro, dramaturgo, diretor, ator e escritor, tem um currículo
eclético que inclui diversos prêmios. Dirigiu o teatro de Rua do CPC da UNE e
foi um dos fundadores do Grupo Opinião. Dirigiu também shows de MPB: Chico
Buarque, Milton Nascimento, Baden Powell e MPB4, entre inúmeros outros. Sua
peça mais conhecida, “O Último Carro”, ficou mais de dois anos em cartaz no Rio
de Janeiro e em São Paulo ,
no fim dos anos 70, tendo levantado mais de vinte premiações. Radicado em Belo Horizonte a
partir de 1992, adaptou e dirigiu o projeto Primeiras Estórias, repetindo o
feito como diretor convidado pela Unicamp para a montagem de formatura de 1995.
Colaborou com a cantora Titane como diretor de seus espetáculos “Inseto Raro” e
“Sá Rainha” (2000 e 2001). Atualmente, circulam pelo país seus espetáculos
“Besouro Cordão de Ouro”, “A Santinha” e “Os Congadeiros”, “Titane e o Campo das
Vertentes” e “A Farsa da Boa Preguiça”. É premiado com o Molière de melhor
direção e Prêmio Brasília de melhor autor, ambos em 1976, e com o Prêmio
Mambembe de melhor diretor, em 1977. Nos últimos anos, foi indicado ao prêmio
Shell pela direção de “Besouro, Cordão de Ouro” (2007) e de “Farsa da Boa
Preguiça” (2009), no Rio de Janeiro.
Luciana Mitkiewicz - Atriz, produtora,
pesquisadora e docente, é formada em Artes Cênicas pela Unicamp (2003) e Mestre em
Teatro pela Unirio, em 2007. Como bolsista da FAPESP e da Capes, desenvolveu
estudo focado no trabalho do intérprete e na direção de atores, tanto em
pesquisa iniciada durante seus estudos de graduação (Bolsa FAPESP – Treinamento
Técnico e Pré-Expressividade) e em oficinas na Escola de Cinema de Santo Antonio
de los Baños/ EICTV, Cuba (direção de atores para cinema). Trabalhou com
renomados diretores de teatro, como Márcio Aurélio, Renato Cohen e João das
Neves, e foi premiada como melhor atriz na IV Mostra de Diálogos Dramáticos de
Limeira, pelo espetáculo Tea Party. Em 2006, forma o grupo Bonecas Quebradas e
encena O CHÁ. O espetáculo realiza
temporadas e apresentações nas cidades de Curitiba, Campinas, Rio de Janeiro,
Niterói, Barra Mansa e nas unidades do SESC de Madureira, Ramos e São Gonçalo,
nos anos de 2007 e 2008. Como docente, prestou serviço para a administração
pública (Projeto Vocacional/ SP, Oficinas Culturais do Estado de São Paulo e
Centro Coreográfico da Cidade do Rio de Janeiro), e trabalhou como professora
nos cursos do Centro de Culturas Ancestrais Sybila Rudana/ RJ e no Senac SP,
unidade Lapa Scipião, no Curso Técnico de ator. Como produtora, cria, formata,
inscreve em Leis de Incentivo e desenvolve projetos próprios e para terceiros
na área da cultura. Seus últimos projetos foram: Jogo Coreográfico – em
parceria com Lígia Tourinho – vencedor do Prêmio FUNARTE de Performances de
Rua, de 2010, e As Polacas, aprovado no edital do CCBB 2011.
Ficha técnica:
Texto e
direção: João das Neves
Diretor Musical: Alexandre Elias
Cenários: Hélio Eichbauer
Figurinos: Rodrigo Cohen
Iluminação: Aurélio Di Simone
Preparação corporal: Angel Vianna
e Marito Olsson-Forsberg
Assessoria de cultura judaica:
Frida Zalcman
Preparação vocal: Felipe Habib
Projeções em cena: Cris França e
André Scucato
Elenco: Beth Zalcman, Carla
Soares, Eduardo Osorio, Érico Damineli, Felipe Habib, Guilherme Tomaselli
(piano), Iléa Ferraz, Lígia Tourinho, Luciana Mitkiewicz, Rodrigo Cohen e
Wilson Rabelo
Idealização: Luciana Mitkiewicz /
Grupo Bonecas Quebradas
Realização e Produção
Executiva: Bonecas Quebradas Produções Artísticas
Assessoria de
Imprensa: Mada Pereira
Serviço:
As Polacas – Flor do Lodo
Auditório
Salvador de Ferrante (Guairinha)
Dias 20 e 21
de julho às 21h
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