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| Drª Debora de Castro da Rocha |
A crescente digitalização do mercado imobiliário trouxe à
tona a tokenização de ativos, mecanismo que permite fracionar e negociar
direitos sobre imóveis por meio de registros em blockchain.
No entanto, a 21ª
Vara Federal Cível da Seção Judiciária do Distrito Federal, ao acatar a ação
movida pelo Operador Nacional do Sistema de Registro Eletrônico de Imóveis
(ONR), determinou que o Conselho de Corretores de Imóveis extrapolou sua
competência ao tentar legislar sobre o registro de imóveis e ativos virtuais. A
decisão suspendeu a resolução editada pelo Instituto de Registro Imobiliário do
Brasil (IRIB), reacendendo discussões sobre competência normativa, segurança
jurídica e proteção do sistema registral.
A resolução suspensa pelo Judiciário foi editada com o
objetivo de disciplinar a tokenização de ativos imobiliários, permitindo que
imóveis ou frações deles fossem representados por tokens digitais, usualmente
registrados em blockchain. A proposta buscava conferir maior liquidez ao
mercado, facilitar investimentos fracionados e aproximar o setor imobiliário
das inovações do mercado de capitais. Contudo, a decisão judicial que suspendeu
a norma destacou alguns pontos centrais.
O ato normativo que buscava regulamentar a tokenização
imobiliária partiu de uma entidade representativa dos registradores, mas não
possuía força de lei. Por essa razão, o Judiciário entendeu que a criação de um
regime jurídico paralelo de registro imobiliário somente poderia ser instituída
pelo Congresso Nacional, em respeito ao princípio da legalidade estrita. Além
disso, destacou-se o risco de formação de um sistema paralelo de registro, já
que a equiparação da tokenização ao registro imobiliário poderia gerar
duplicidade: de um lado, o registro público oficial, dotado de fé pública e
eficácia erga omnes; de outro, um registro digital privado, sem a mesma
garantia de autenticidade e publicidade, o que acarretaria insegurança quanto à
titularidade e à validade das transações.
O Judiciário também ressaltou a função pública do registro
imobiliário, que não se limita a um ato burocrático, mas constitui atividade
estatal delegada, destinada a assegurar a ordem jurídica, a proteção de
terceiros de boa-fé e a estabilidade das relações patrimoniais. Permitir que
tokens substituíssem esse sistema poderia fragilizar a confiança no regime de
propriedade. Outro ponto considerado foi a proteção do consumidor e do
investidor, uma vez que estes poderiam ser levados a acreditar que a aquisição
de tokens equivaleria à aquisição de propriedade imobiliária, quando, na
realidade, tais instrumentos apenas representam direitos obrigacionais ou de
participação econômica, sem transferir a propriedade plena.
Em síntese, a decisão judicial não rejeita a tecnologia em
si, mas reafirma a centralidade do registro público como pilar da segurança
jurídica imobiliária, funcionando como um freio de cautela para evitar que o
mercado avance em uma zona cinzenta sem respaldo legal claro.
Serviço:
debora@dcradvocacia.com.br
Foto: Ize Cavalheiro.

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