No julgamento do Recurso Especial nº 2172231/MG, o Superior Tribunal de Justiça reafirmou entendimento relevante em matéria contratual e de defesa do consumidor: o registro da escritura pública de compra e venda de imóvel não impede a resolução contratual quando há inadimplemento de obrigações acessórias pactuadas. No caso analisado, embora a transferência da propriedade do imóvel tenha ocorrido formalmente por meio do registro, o STJ reconheceu que a ausência de infraestrutura no loteamento configura descumprimento contratual suficiente para a rescisão e restituição dos valores pagos pelos compradores.
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Drª Debora de Castro da Rocha |
Os adquirentes haviam firmado contrato de compra e venda com
a promessa de que o imóvel seria entregue com todas as obras de infraestrutura
concluídas. Apesar do pagamento integral do preço e do devido registro, essas
obras não foram executadas pela empresa responsável, inviabilizando o uso
efetivo do bem. A ação proposta buscava a resolução do contrato, indenização
pelos danos materiais e a obrigação de fazer, obtendo êxito em primeiro grau.
Entretanto, o Tribunal de Justiça local entendeu que a existência do registro
tornava o contrato irretratável, reformando a sentença e afastando a
possibilidade de rescisão.
Ao analisar o recurso especial, a Terceira Turma do STJ
entendeu de forma diversa. A relatora apontou que o contrato não se extingue
com o registro da escritura quando há cláusulas ainda não cumpridas. Com base nos
artigos 475 do Código Civil e 18, § 1º, do Código de Defesa do Consumidor,
destacou que o inadimplemento relativo à ausência de infraestrutura configura
falha grave na prestação do serviço, violando o princípio da boa-fé objetiva e
autorizando a resolução do contrato com o retorno ao status quo ante.
A decisão esclareceu que o registro da propriedade é apenas
parte do cumprimento do contrato e não exonera o vendedor do cumprimento de
demais obrigações contratuais. A Corte determinou a restituição integral das
quantias pagas, incluindo valores relativos a tributos, corretagem e multa
contratual, e ainda ordenou a retificação do registro imobiliário para que o
imóvel voltasse à titularidade da empresa vendedora. Assim, restabeleceu-se a
sentença de primeiro grau em favor dos consumidores lesados.
O entendimento da Corte busca consolidar a jurisprudência
protetiva ao consumidor, que impede que a formalização registral seja utilizada
para legitimar o descumprimento contratual. Trata-se de uma importante reiteração
do princípio de que o contrato só se considera cumprido quando todas as
obrigações pactuadas forem efetivamente executadas. Para os operadores do
Direito, a decisão representa um sinal claro de que o STJ não admite soluções
formais que desconsiderem a substância e a finalidade da relação contratual.
E-mail: debora@dcradvocacia.com.br
Foto: Cla Ribeiro.
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