quinta-feira, 6 de novembro de 2025

ARTIGO: STJ consolida entendimento sobre multa e taxa de fruição em rescisão de contratos imobiliários

 

Drª Debora de Castro da Rocha

A rescisão de contratos de compra e venda de imóveis em loteamentos urbanos sempre foi objeto de intensos debates jurídicos, sobretudo pela ausência de regras claras antes da edição da Lei 13.786/2018, conhecida como Lei do Distrato. Até então, a Lei 6.766/1979 previa a irretratabilidade desses contratos (art. 25), o que, em tese, inviabilizava a desistência unilateral do adquirente.


A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, contudo, mitigava essa rigidez com fundamento no Código de Defesa do Consumidor, especialmente no art. 53, admitindo a resolução contratual mediante retenção de parte dos valores pagos, geralmente entre 10% e 25%, como forma de compensar os prejuízos do vendedor, a exemplo do que foi decidido no REsp 1.300.418/SC, relatado pelo Ministro Luis Felipe Salomão.

Com a entrada em vigor da Lei 13.786/2018, o regime jurídico dos distratos foi substancialmente alterado. O novo art. 26-A da Lei 6.766/1979 passou a prever expressamente a possibilidade de rescisão, estabelecendo parâmetros objetivos para a retenção de valores. Entre eles, destacam-se a cláusula penal de 10% sobre o valor atualizado do contrato (§1º, I) e a taxa de fruição de até 0,75% ao mês sobre o valor atualizado do contrato (§1º, II), aplicável inclusive em lotes não edificados.

Foi nesse contexto que a Quarta Turma do STJ analisou um contrato firmado em 2021, no qual o comprador, após pagar pouco mais de R$ 6 mil de um total de R$ 111 mil, desistiu do negócio. A vendedora aplicou a multa contratual e a taxa de fruição, o que foi questionado judicialmente. Tanto o Tribunal de Justiça de São Paulo quanto o STJ mantiveram a legalidade das retenções. A relatora, Ministra Isabel Gallotti, destacou que a Lei do Distrato autoriza a cumulação das penalidades, independentemente de o lote estar edificado, e que não há afronta ao art. 53 do CDC, uma vez que não se trata de perda integral das parcelas pagas, mas de descontos previstos em lei. Ressaltou ainda que, no caso concreto, o valor pago sequer foi suficiente para cobrir a multa e a taxa, razão pela qual não houve devolução ao comprador.

O acórdão estabelece que a taxa de fruição pode ser exigida mesmo em lotes não edificados, afastando a necessidade de comprovação de uso efetivo do bem, e confirma a possibilidade de cumulação de penalidades, desde que respeitados os limites percentuais fixados em lei. Esse entendimento tende a reduzir divergências entre tribunais estaduais e a oferecer maior segurança jurídica às partes envolvidas.

A decisão da Quarta Turma do STJ ao admitir a retenção simultânea de multa contratual e taxa de fruição em contratos de compra e venda de lotes não edificados, estabelece critérios objetivos para a resolução contratual, reforça a importância da observância estrita da legislação vigente, visando contribuir para a estabilidade das relações contratuais, sem afastar a proteção ao consumidor prevista no CDC.

Serviço:

debora@dcradvocacia.com.br

Foto: Divulgação.

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